Ressuscitem os Rábulas
Quem leu algum
jornal no último dia 18 de junho deve ter se deparado com algum jornalista
criticando a decisão do Supremo Tribunal Federal em extinguir a obrigatoriedade
do diploma para o exercício da profissão de jornalista. Desde então, minha
principal diversão é colecionar artigos que tratem desse assunto. Se você
encontrou algum, pode enviar para o meu email:
<abaixo_à_obrigatoriedade@podecrer. é isso aí, sacou?. com. br>.
Já cataloguei
várias pérolas. Vamos a elas.
Sônia Pillon,
por exemplo, publicou um artigo no jornal Hoje, de Jaraguá do Sul, na edição do
dia 18 de junho, dizendo o seguinte: “Você contrataria um exímio açougueiro
para fazer uma cirurgia no lugar do veterinário? Como admitir que uma atividade
que exige, não somente conhecimento, mas também ética e comprometimento social,
possa ser exercida por alguém sem formação?”. Já Moacir Pereira, do Jornal de
Santa Catarina, de Blumenau, foi mais fundo. Ele disse: “Qualquer um pode ser
jornalista? Então, ressuscitem os rábulas, os curandeiros e os práticos da
odontologia.”
A gaúcha Sônia
Pillon, além de ver semelhança entre jornalistas sem diploma e exímios
açougueiros, se arrisca na literatura. Em 2007, alguns de seus textos
integraram a coletânea “Jaraguá em Crônicas”. No conto chamado “O Sonho do
Jornalista Sessentão”, ela diz: “Não quero mais saber de escrever com tema
definido, hora marcada, texto engessado, milimetrado, com regras absolutistas
que não podem ser questionadas!” E chega ao ápice de seu lirismo kitsch e seu sentimentalismo
ginasiano com a seguinte frase: “Quero a liberdade para redescobrir o lirismo
de minha escrita, voar nas asas da imaginação e me embriagar de emoção!” Sônia
diz não admitir que o jornalismo seja exercido por alguém sem formação. Eu digo
que não deveria ser admitido que textos como o de Sônia -“voar nas asas da
imaginação e me embriagar de emoção”- sejam chamados de literatura.
Os jornalistas
sempre estiveram associados a posturas revolucionárias. Bastou que eles
sentissem que a sua reserva de mercado estava sendo ameaçada para que
revelassem suas facetas mais reacionárias. Sônia perguntou e eu respondo: Não.
Ninguém iria contratar um exímio açougueiro para fazer uma cirurgia no lugar de
um veterinário. Nem mesmo se fosse extinta a obrigatoriedade do diploma para
veterinários. E assim vai ser em relação aos jornalistas e a todas as outras
profissões. O mercado é “meritocrata”, e não "diplomata” (com o perdão do
trocadilho). Eu garanto que Sônia Pillon nunca venderá livros como Simone de
Beauvoir, sua autora preferida, nem mesmo se tivesse Pós-Phd (com o perdão do
neologismo) em literatura. Por quê? Porque um diploma, em algumas profissões,
não é garantia de “ética e comprometimento social”, como acredita Sônia, nem é
garantia de coisa alguma, acredito eu. Há médicos que esquecem tesouras e
outros objetos em seus pacientes. Há advogados que roubam seus clientes. Há
engenheiros como Sérgio Naia. Sônia Pillon não vai vender como Simone de
Beauvoir por uma única razão: sua literatura é ruim. É uma poltronice
intelectual achar que a não obrigatoriedade de diploma vá mudar alguma coisa.
Os ruins irão permanecer dentro e fora. Com ou sem diploma. Em qualquer
profissão. O mercado há de regular isso e não uma lei.
O Ministro
Gilmar Mendes deve ter lido o artigo de Moacir Pereira e, seguindo seu
conselho, disse que o próximo passo é, justamente, “ressuscitar os rábulas”.
Concordo. Afinal, ninguém precisa dos contos de Sônia Pillon. E ninguém
precisa, também, de advogados.
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