sábado, 6 de dezembro de 2014

Quero-queros

Na última quarta-feira, Coritiba e Corinthians jogaram pelo Campeonato Brasileiro de futebol, na cidade de Curitiba. O jogo foi horrível e terminou com um tedioso 1 a 1. Essa é uma das razões para os norte-americanos não gostarem de futebol, ao qual eles chamam de Soccer. Um bom jogo, para os americanos, tem que terminar com um placar de 60 a 48, no mínimo. É por isso que, por lá, o Baseball, o Basquete e o Futebol Americano são tão populares. Não passa pela cabeça de um norte-americano gostar de uma modalidade esportiva em que existe a possibilidade de a partida terminar sem que nenhum ponto seja marcado. A relevância dessa peculiaridade sobre o gosto esportivo dos americanos é que o futebol no mundo seria outro se os Estados Unidos resolvessem entrar na jogada. Mas, para esse texto, a relevância é ainda outra. Se os americanos não gostam do futebol pela aborrecida possibilidade de uma partida terminar sem nenhum ponto marcado, eu passei a gostar um pouco menos de futebol, desde a última quarta-feira, por conta de uma repentina e gratuita afetividade por uma ave da ordem dos Ciconiiformes, pertencente à família dos Charadriidae. Mas, vamos chamá-los de Quero-quero.
Uma bela fêmea de Quero-quero escolheu, para construir seu ninho, a ponta esquerda da grande área da trave à direita de quem entra no estádio Couto Pereira pela entrada principal. Somente a partir dos 10 minutos de partida é que o goleiro do Corinthians se deu conta da presença da fêmea e mais dois filhotes. A câmera da Tv Bandeirantes, que transmitia a partida, chegou a focalizá-los. Depois disso, eu, que estava torcendo para a equipe do Coritiba, virei a casaca. Passei a torcer pelo Quero-quero.
O goleiro do Corinthians chegou a alertar o árbitro da partida sobre a presença do Quero-quero, mas não foi ouvido e o jogo prosseguiu. Onde estava o Green Peace na última quarta-feira à noite? E a equipe do projeto TAMAR? E os membros do Instituto Iara? E o Roberto Zeininger, onde estava? E os milhares de outros membros dessas entidades protetoras da vida animal?
 O jogo teria que ser paralisado imediatamente. Os juízes deveriam realizar uma reunião relâmpago e decidir, depois de ouvir a vontade do Quero-quero, obviamente, se o jogo seria transferido de local, de data, ou se a ave é quem seria transferida.
Existe um outro campo de futebol próximo ao Couto Pereira, que é o campo do Atlético Paranaense. Por mim, o jogo deveria ser, imediatamente, transferido para lá. Os mais de trinta mil torcedores, todos em fila indiana, desceriam pela rua Ubaldino do Amaral até o cruzamento com a avenida Getúlio Vargas. De lá, subiriam até a Baixada. Não sou um militante ecológico, como o Roberto Zeininger - por exemplo, mas sei que um Quero-quero, em qualquer condição, vale mais que o time do Corinthians inteiro, com ou sem Ronaldo. Um filhote de Quero-quero vale mais que toda a torcida do Coxa. O repórter da Tv Bandeirantes, Fernando Fernandez, pensa como eu. Tanto é verdade que, no intervalo do jogo, ao entrevistar o goleiro Felipe, do Corinthians, o que você acha que ele perguntou? Aquelas obviedades, sobre o que ele estava achando do jogo? Perguntou se o esquema tático do Timão continuaria o mesmo, apesar de estar perdendo a partida? Não. Fernando Fernandez perguntou sobre o que de fato tinha importância. Perguntou sobre o Quero-quero. Por mais que o narrador, Luciano do Valle, tentasse fazer com que o repórter esquecesse da ave, ele se manteve firme questionando o goleiro sobre a situação dos bichinhos.
Ernesto Felipe Blunk, Celso Garcia e Gilo Santos gostam de futebol e, muito provavelmente, assistiram a esse jogo. Garanto que eles também compartilham da mesmo opinião do Fernando Fernandez e da minha. É ou não é, Blunk? É ou não é, Celso? Hein, Gilo?

Enquanto houver a possibilidade de uma partida de futebol terminar sem pontos, os americanos continuarão fora do esporte. Enquanto os juízes de futebol não entenderem o valor de um Quero-quero, vou procurar o Kutcha e, juntos, fundaremos uma ONG de proteção aos Vanellus chilensis, nome científico dos nossos adoráveis Quero-queros.

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